O milionário negócio da ‘ressurreição’ na folha do INSS Existe vida após a morte na Conafer, entidade do trabalhismo rural que em 2024, segundo o governo, fez 1.135 pessoas mortas voltarem à vida na folha do INSS No final do ano passado, uma entidade sindical foi intimada numa auditoria do governo a apresentar amostragem de cem fichas do seu universo de 620 mil associados, na maioria pessoas idosas e com deficiência que sobrevivem com o salário-mínimo mensal recebido da Previdência Social.
A Conafer (Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais) faturava 800 milhões por ano com descontos diretos nos pagamentos dos beneficiários do INSS.
O governo queria fazer uma checagem na regularidade das cobranças feitas pela entidade.
O presidente da Conafer enviou a amostra pedida pela Controladoria-Geral da União.
Nesta segunda-feira (29/9), Carlos Roberto Ferreira Lopes foi interpelado sobre as fichas no plenário da CPMI da Fraude no INSS.
A audiência permitiu um vislumbre da anarquia interessada no sistema de Previdência Social.
📊 Fatos e Dados
— O senhor é o presidente da Conafer, e foi o senhor quem mandou para a CGU… — disse o relator da comissão, deputado Alfredo Gaspar (União-AL).
— O senhor mandou a ficha da dona Maria Rodrigues.
A dona Maria Rodrigues já tinha morrido há cinco anos, mas ela “fez” uma “assinatura”.
O Gilberto, o Gilberto, morreu há vinte anos, mas “assinou”.
Olha, esse padrão se repetiu mais de 300 vezes… As fichas deixam pouca margem para dúvidas: existe vida após a morte na Conafer, milionária entidade do trabalhismo rural que declara existência em 2.950 municípios, com 1,2 mil funcionários, e há cinco meses está interditada pela Justiça depois de 71 mil processos de gente que se sentiu roubada, mas está viva.
— É padrão da Conafer ressuscitar mortos para assinatura de “descontos” associativos?
— ironizou o deputado-relator.
— É padrão do INSS ter defunto recebendo benefício?
— retrucou o presidente da confederação.
É padrão do INSS, é padrão do INSS aceitar desconto de defunto?
—A pergunta é bem objetiva: é padrão Conafer ressuscitar mortos para conseguir “descontos” associativos?
Sim ou não?
— Se o morto estiver recebendo benefício, pelo jeito, sim, né?
— Eu quero, eu quero parabenizar, porque a Conafer botou no bolso 800 milhões de aposentados e pensionistas, sendo que 100% do recorte feito pela CGU não tinha autorizações válidas.
📊 Informação Complementar
A pergunta ao depoente: a Conafer, a Conafer repetiu esse padrão centenas de vezes.
O senhor tinha conhecimento disso?
— Eu não… A Conafer desconhece que pessoas em óbito recebam benefício.
Por que uma pessoa em óbito está recebendo benefício, senador… deputado?
— O senhor poderia esclarecer, já que isso legalmente não é possível, como isso se repetiu mais de 300 vezes na Conafer, entidade que o senhor preside?
— Tal, tal “abscesso da lógica”, nobre relator, “abscesso da lógica” é haver desconto num cara que está morto.
Como é que existe um desconto aceito pelo INSS numa pessoa que já morreu?
Como é que essa pessoa está recebendo benefício, relator?
— Olha, em 2021, a Conafer fez o milagre de ressuscitar 87 mortos para “desconto” associativo.
Em 2022, o milagre da “ressurreição” caiu para 61.
Em 2023, o milagre explodiu, 2.083 “ressuscitados”.
Em 2024, 1.135, segundo os dados da CGU.
O senhor poderia explicar como isso aconteceu?
Lopes falou à CPMI por mais de oito horas, mas não explicou o fenômeno da “ressurreição” na Conafer, que criou década e meia atrás e dirige como empresa familiar, a exemplo do que acontece em outras 20 entidades similares que extraíram mais de cinco bilhões de reais do caixa da Previdência Social na última década.
Também não esclareceu a razão de transferências financeiras atípicas — entre outras, a de 100 milhões de reais para um assessor e o recebimento de 60 milhões reais de uma papelaria.
O presidente da Conafer terminou a audiência preso.
Por volta da 1h30 desta terça-feira apresentou à Polícia Legislativa um atestado emitido pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), onde se lia: Carlos Roberto Ferreira Lopes, 46 anos, autodeclarado indígena da etnia tapuia, é residente do território indígena Caramuru-Catarina Paraguassu e está assistido por esta fundação de acordo com a Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, que rege o estatuto das comunidades indígenas brasileiras.
Pau Brasil, Bahia,
14/08/2025.
Conafer e similares são beneficiários de um sistema anárquico de administração pública que mantém, por exemplo, treze milhões e cem mil pessoas mortas no último meio século que ainda sem registro na principal base de dados do governo, o Sistema Nacional de Informações de Registro Civil.
O mapeamento foi feito pelo Tribunal de Contas da União.
Tem mais defunto fora do arquivo nacional do que gente viva na população recenseada de São Paulo, a maior a maior cidade do país.
Esse número de falecidos marginalizados pela burocracia equivale à soma dos habitantes de cinco capitais: Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília e São Luís.
Fonte: veja
30/09/2025 18:13