Aos 70 anos, Jair Bolsonaro teme o futuro.
Ele bate à porta da sua confortável casa em Brasília, na terça-feira (2/9), onde está confinado e vigiado por ordem do Supremo Tribunal Federal.
Bolsonaro tem bons motivos para sobressaltos.
Aguarda em prisão domiciliar uma sentença judicial que pode obrigá-lo a atravessar o resto da vida recluso e marginalizado do jogo político-eleitoral.
💥 Impacto e Consequências
É acusado de crimes contra a Constituição — entre eles, tentativa de golpe de Estado —, com três dezenas de aliados civis e militares.
O julgamento no STF é o epílogo da aventura desse grupo político mambembe para se manter no poder, depois da derrota na eleição presidencial de 2022.
📊 Informação Complementar
São notáveis alguns aspectos do retrato de Bolsonaro apresentado por seus defensores, que devem ser realçados nessa fase final do julgamento no STF.
Nada tem a ver com o veemente presidente instigando desobediência civil ao Judiciário e o confronto com juízes “canalhas”, ou o truculento candidato incitando a aniquilação de adversários “petralhas” liderados por “ladrão”, “vagabundo”, “pinguço”… No processo, ele é descrito quase como personagem de uma fábula, que poderia começar assim: “Era uma vez um pobre coitado presidente da República, que vagava deprimido, combalido e débil pelas salas e jardins do Palácio da Alvorada, em Brasília, depois de perder a eleição de 2022…”.
📌 Pontos Principais
É o que diz a versão do próprio Bolsonaro nos autos, construída com base nos depoimentos de testemunhas de defesa sobre a sua situação emocional nas semanas de efervescência golpista.
Depois da derrota nas urnas, ele escolheu se isolar e permaneceu as semanas finais do governo em “profunda tristeza”, “cabisbaixo”, “monossilábico”, “deprimido”, “desgastado”, “debilitado”, “doente e com dores”.
Nada disso, ressalva a acusação, atropelou o ânimo do então presidente para se reunir inúmeras vezes com aliados e discutir alternativas de um golpe de Estado.
Essa ideia foi recorrente, quase uma fixação, em discursos de Bolsonaro durante os 28 anos em que foi deputado federal.
“Caso Bolsonaro permite vislumbre da liquefação política brasileira”
Na Câmara nunca foi punido, nem quando sugeriu fuzilar o presidente da República.
Foi protegido com a blindagem corporativa, aplicada até a caso de réu por assassinato — como mostrou a Câmara ao se recusar a cassar um antigo aliado de Bolsonaro, o deputado Chiquinho Brazão, acusado de mandar fuzilar a vereadora Marielle Franco no centro do Rio.
Na primavera de 2022, no Alvorada, desenhou-se anulação do resultado das urnas, instauração de junta provisória de governo, deposição ou prisão de juízes do Supremo e, eventualmente, nova eleição.
Foi encontrado um plano de assassinato dos adversários eleitos, Lula e o vice Geraldo Alckmin, e, também, do juiz Alexandre de Moraes, que presidia o Tribunal Superior Eleitoral.
Autor confesso, o general Mário Fernandes era secretário-executivo da Presidência da República.
No tribunal, ele definiu o projeto de triplo homicídio por motivos políticos como se dissertasse sobre um cândido aprendiz da arte de matar: “Um pensamento meu que foi digitalizado; um compilar de dados; um estudo de situação meu; uma análise de riscos que fiz e, por costume próprio, resolvi digitalizar…”.
Imprimiu cópia no palácio, na sala ao lado de onde estava Bolsonaro.
Foi somente “para não forçar a vista” na leitura do prospecto com o título “Punhal Verde Amarelo” numa tela de telefone ou computador.
O que aconteceu depois?
“Rasguei.
Não compartilhei esse arquivo com ninguém.” Não se encontra em Brasília um político capaz de apostar em outro desfecho no STF que não seja a condenação de Bolsonaro e dos civis e militares associados na intolerância com a divergência política.
Já é o segundo ex-presidente em prisão domiciliar.
Fernando Collor cumpre em casa, em Maceió, pena de oito anos e dez meses por corrupção em contratos na Petrobras.
É um caso raro de punição na Lava-Jato confirmada pelo STF, que tende a balizar a sentença de Bolsonaro.
Esse julgamento acende luzes sobre a disfuncionalidade das instituições num país que somente nos últimos sete anos prendeu tantos ex-presidentes quanto havia aprisionado nos primeiros 129 anos da República.
Desde 2018 foram presos quatro ex-chefes de Estado: Michel Temer, Lula, Fernando Collor e Jair Bolsonaro.
Em quatro décadas desde a redemocratização, dois presidentes foram derrubados, e pedidos de impeachment contra o governo e o Judiciário viraram rotina no Congresso.
O caso Bolsonaro permite um vislumbre da liquefação política brasileira.
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Publicado em VEJA de 29 de agosto de 2025, edição nº 2959
Fonte: veja
30/08/2025 19:20