A verdade sobre a melatonina: aliada do sono ou moda arriscada?
Em forma de gotas, gomas e comprimidos, substância virou panaceia, mas muita gente usa de forma equivocada Nos últimos anos, a melatonina se tornou uma das substâncias mais comentadas entre os brasileiros que buscam melhorar o sono.
Nas redes sociais, multiplicam-se promessas de noites tranquilas por meio de gotas, gomas ou comprimidos vendidos como suplementos.
Mas, apesar da ampla popularização, o uso correto da melatonina ainda é pouco compreendido.
🔍 Detalhes Importantes
E, não raro, feito de forma inadequada.
A melatonina é um neuro-hormônio produzido pela glândula pineal, no cérebro.
Sua produção pelo organismo segue o ciclo claro-escuro do ambiente: aumenta à noite, em resposta à ausência de luz, e despenca durante o dia.
Quando a claridade atinge os olhos, receptores específicos enviam um sinal ao núcleo supraquiasmático, o “marcapasso” do nosso relógio biológico, inibindo a liberação do hormônio.
🌍 O Cenário Atual de veja
Esse mecanismo natural prepara o organismo para dormir.
À medida que a melatonina sobe, a temperatura corporal diminui, iniciando o processo fisiológico do sono.
Além de atuar no ciclo vigília-sono, a melatonina participa de outro elemento característico da noite: o jejum.
Por isso, especialistas alertam que não faz sentido ingerir melatonina e comer logo em seguida, já que o hormônio interfere na secreção de insulina e sinaliza ao corpo que é hora de repouso metabólico.
Apesar do entusiasmo popular, as indicações médicas formais para a melatonina sintética são limitadas.
No Brasil, a Anvisa aprovou apenas a dose de 0,21 mg, considerada fisiológica.
As famosas versões com 3 mg, 5 mg ou até 10 mg, comuns em outros países, são suprafisiológicas e não seguem a lógica natural de funcionamento do hormônio.
Mesmo as doses baixas devem ser usadas exclusivamente com orientação médica.
Entre os usos reconhecidos da melatonina, alguns oficialmente aprovados, outros consagrados na prática clínica como off-label, estão o jet lag, em que ela auxilia na adaptação ao novo fuso horário após viagens longas.
O hormônio também é empregado nos distúrbios do ritmo circadiano, situações em que o relógio biológico do indivíduo está adiantado ou atrasado, provocando insônia ou sonolência em momentos inadequados.
📊 Informação Complementar
A melatonina ainda aparece como alternativa terapêutica no autismo, condição na qual estudos indicam melhora na consolidação do sono e no comportamento noturno.
Outro uso ocorre nos casos de cegueira sem percepção de luz, em que ela contribui para sincronizar o ciclo vigília-sono, já que esses pacientes não recebem o estímulo luminoso que naturalmente regula a produção do hormônio.
Há ainda situações particulares, como o distúrbio comportamental do sono REM, nas quais a melatonina pode ajudar, mas sempre sem indicação oficial e sob supervisão especializada.
Outro ponto importante é diferenciar a melatonina dos agonistas melatoninérgicos, como a ramelteona, medicamento disponível no Brasil que imita a ação do hormônio diretamente nos receptores do cérebro.
Por ser um fármaco, tem eficácia e segurança mais bem estabelecidas, além de não provocar efeitos periféricos da melatonina, presente em vários órgãos do corpo.
Como qualquer substância ativa, a melatonina não é isenta de riscos.
Em doses elevadas, pode provocar sonolência residual pela manhã, já que o hormônio permanece alto quando deveria estar em queda.
Também pode causar dor de cabeça, tontura, náusea e sonhos vívidos ou pesadelos.
Em algumas pessoas, curiosamente, melhora quadros de cefaleia ou parassonias.
Por fim, especialistas reforçam a importância de verificar a procedência do produto.
Toda melatonina vendida no mundo é sintética, mas isso não garante que todas as marcas tenham controle de qualidade rigoroso e a ausência de fiscalização sobre suplementos aumenta esse risco.
A popularidade da melatonina contrasta com um fato simples: ela não é um tratamento universal para insônia, nem deve ser consumida como vitamina.
Trata-se de um hormônio que atua de forma precisa no relógio biológico e que só faz sentido quando usado na dose certa, no momento certo e pelas razões corretas.
Quem busca melhorar o sono deve priorizar hábitos saudáveis, higiene do sono e, se necessário, acompanhamento médico.
A melatonina pode ser uma aliada, mas nunca uma solução mágica.
* Dalva Poyares é neurologista e pesquisadora do Instituto do Sono
Fonte: veja
23/12/2025 23:43











