O recém-aposentado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, costuma afirmar que o ativismo judicial no Brasil é um “mito”.
Mas, ao transformar sua convicção pessoal em decisão judicial, Barroso encerrou seu mandato como começou, comprovando que não apenas o ativismo, mas o oportunismo judicial estão mais vivos do que nunca.
O ministro despediu-se votando pela descriminalização do aborto até a 12.ª semana de gestação – um gesto previsível em conteúdo, mas escandaloso na forma e no foro.
💥 Impacto e Consequências
O problema não está na posição pessoal de Barroso, mas na presunção de que magistrados possam decidir o que o povo deve pensar, normatizando sobre um tema moral e político dessa magnitude.
Nas horas finais de seu mandato, Barroso pediu uma sessão extraordinária e virtual, para, assim como Rosa Weber antes dele, lacrar seu testamento ideológico.
O gesto diz menos sobre coragem e mais sobre vaidade.
🧠 Análise da Situação
A irresponsabilidade com que armou a cena – um julgamento noturno e sem debate, improvisado por uma “urgência” fabricada – converteu a toga em púlpito e o Supremo em palco, não só violentando a soberania popular, a separação dos Poderes e a ordem jurídica, mas deslegitimando a natureza colegiada da própria instituição que presidiu.
O STF não tem competência para legislar.
A ação em que Barroso interveio, proposta pelo PSOL, busca anular artigos do Código Penal que tratam do aborto – uma decisão que cabe ao Congresso Nacional.
💥 Como estadao Afeta o Cotidiano
Ao afirmar que “direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas”, Barroso tem razão ao destacar o caráter contramajoritário do Supremo, cuja função é resguardar o texto da Constituição a despeito do clamor popular.
Mas o dever da Corte é justamente aplicar as leis e a Constituição tal como foram redigidas e aprovadas como expressão da vontade da maioria da sociedade, por meio de seus representantes.
Quando o STF interpreta a Lei Maior de modo a substituir a deliberação política por suas convicções, vale dizer, pela ideia que faz de como a lei deveria ser, arroga para si o papel de legislador moral da Nação – algo que a democracia representativa jamais lhe conferiu.
Há, ainda, falácias e incoerências que não resistem a uma leitura honesta.
Barroso sustenta que a criminalização do aborto viola direitos das mulheres, mas ignora que esses direitos, como todos os outros, se equilibram no texto constitucional com o direito à vida, e que qualquer alteração nesse balanço deve ser feita por via legislativa.
Barroso argumenta que o Estado não deve ter o poder de “obrigar a mulher a ter o filho que ela não quer”, já que “as mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazer suas escolhas existenciais”, mas ele mesmo, por razões insondáveis que seguramente não estão na Constituição, impõe um limite a essas escolhas a partir da 12.ª semana de gestação.
A forma como Barroso decidiu proferir seu voto é a síntese de um estilo: o do magistrado que se vê como pedagogo da Nação.
Ao longo de sua trajetória, o ex-ministro cultivou a ideia de que o Supremo deve “empurrar a História na direção certa”.
📊 Informação Complementar
Mas quem define essa direção?
Ao substituir o debate público pelo monólogo togado, o pretenso iluminismo se transforma em autoritarismo de gabinete.
O ativismo judicial, quando justificado como missão civilizatória, torna-se apenas uma forma sofisticada de despotismo ilustrado.
Questões como o aborto, que tocam a consciência moral de uma sociedade, pertencem ao povo – seja diretamente, por plebiscito, seja por meio de seus representantes eleitos.
A omissão do Congresso, se há, não é desculpa para intervenção judicial; é expressão legítima da prudência democrática.
Tanto pior quando não há omissão nenhuma, como no caso da legislação sobre o aborto.
Barroso sai do Supremo com o brilho de quem fala bonito e o rastro de um juiz que não se resignou a aplicar a lei tal qual ela é, mas a reinventá-la tal qual ele julga que deveria ser.
Sua última decisão simboliza o colapso de uma fronteira que ele próprio ajudou a apagar: a que separa o juiz do político, a toga da tribuna.
Num país de mais de 150 milhões de eleitores, nenhuma biografia, por mais ilustre que seja – ou que se imagine –, tem o direito de substituir o povo.
O Estado de Direito não é o governo dos iluminados – é o governo das leis, e estas só valem quando emanam da vontade soberana da Nação.
Fonte: estadao
23/10/2025 10:36











