Tenho 62 anos e já uso filas preferenciais e vagas exclusivas.
Sou, juridicamente, um idoso, melhor idade ou quaisquer eufemismos que sejam inventados.
Tenho pensado na ambiguidade dos “early sixties”: sou a velhice da juventude e a juventude da velhice.
Tenho amigos octogenários e nonagenários.
Convivendo com eles, observei lições para o Leandro de 82 anos.
São coisas que testemunhei em muitas pessoas que cruzaram a marca das oito décadas.
São conselhos meus para mim a partir do que vejo hoje.
Veja com o que você concorda e do que discorda.
Caro Leandro de 82 anos:
– Tente manter o peso mais baixo.
Sobrepeso estoura articulações.
Não é um debate sobre ideal estético: é Newton.
Massa maior sobrecarrega joelhos.
A mobilidade faz encontrar pessoa e adia demência.
Mobilidade é ouro!
– Evite a teimosia, uma das marcas da terceira idade.
Ela se disfarça de hábitos.
A vida recomenda alguma flexibilidade.
– Não fique em casa lamentando que amigos, filhos ou netos (se houver) visitam pouco.
Reflita sobre o motivo da raridade da presença.
Que ambiente encontram?
Há reclamações e conversas de doenças?
Melhore a beleza das flores do jardim e pare de chorar pelas borboletas ausentes.
– Se ainda existir zap ou similar, evite excesso de mensagens e imagens.
Veja que as pessoas não respondem a seu fluxo de bom dia, boa tarde, boa noite.
Não vire tiozão ou avozão do zap.
Cuidado com imagens de flores.
Atenção especial a teorias conspiratórias: elas denunciam o fim do seu mundo e não o fim do mundo.
– Reprima o desejo infinito de aconselhar.
Espere ser consultado ou demandado.
Não invada espaços, não forneça análises não solicitadas.
Bêbados, crianças e velhos perdem um pouco do controle vocal.
Recupere-o.
Cale mais, pergunte mais, ouça mais.
– Movimente-se.
Visite pessoas próximas.
Escreva cartões.
Caminhe.
Alongue-se.
Coloque barras na casa toda e no box.
Fuja de sapatos perigosos e de chinelos.
Ande.
Nade se conseguir.
Aprenda algo novo.
– Reveja bons filmes e coloque alguns novos no cardápio visual.
Insista em museus.
A maioria oferece vantagens para público mais experiente.
Aprenda sempre.
– Reaja contra a tristeza.
Saia e converse com alguém.
Leia coisas boas.
Respire fundo, tome uma água boa, erga um brinde ao que você já fez na vida e faça planos.
O horizonte de amanhã é forte para afastar névoas melancólicas.
– Pessoas mais velhas possuem o dom de errar ao dar presentes para jovens.
Pergunte mais e descubra o que a pessoa gostaria de ganhar de verdade.
Não se presenteie ao comprar algo para outra pessoa.
– Se possível, procure um geriatra para coordenar os muitos médicos da terceira idade.
📊 Informação Complementar
O navio do seu corpo precisa de um capitão.
Consulta a um geriatra aos 45 é treinamento de incêndio; aos 85 é luta para que o fogo não consuma tudo.
Comece cedo.
– Cachorros e gatos são boas companhias.
Se gostar, tenha um ou dois.
Adote.
– Releia livros como: Antes de Partir – os cinco principais arrependimentos que as pessoas têm antes de morrer (Bronnie Ware, Geração) e todos os livros da doutora Anna Claudia Quintana Arantes, especialmente Histórias Lindas de Morrer.
Decore uma poesia nova por mês.
– Há borboletas que duram 48 horas.
Há tartarugas que passam de 200 anos.
Há tubarões que vivem séculos.
A vida não deve ser medida pela quantidade numérica, mas pela qualidade de usufruir o tempo.
Tem gente que vive bem 60 anos e outros se arrastam por 90.
– Os enterros aumentam com o tempo.
Temos de ir a muitos.
Insista em visitar também recém-nascidos.
Viva mais inaugurações do que encerramentos.
– Há bons motivos para brigar e boas causas para defender.
A maioria dos enfrentamentos pode ser superada analisando seu ego e não o caso em si.
Como brigar na terceira idade é perigoso, escolha bem suas guerras e entre naquelas raras que são muito importantes.
– Meu velho: você seduziu homens e mulheres há décadas?
Era uma pessoa arrasadora em corações e corpos?
O cacoete sobrevive mais do que a libido.
O hábito é forte e você pode confundir coisas.
Nem todo sorriso é um convite à orgia.
A moça ou o rapaz podem estar achando você um vovô simpático ou uma vovó catita.
Você pode ser um sedutor ou uma sedutora até idade avançada.
Apenas precisamos de mais cuidados e discernimento na etapa final.
– Velhice é muito cara.
Guarde dinheiro.
Não seja um faraó que começa a fazer seu túmulo no dia da coroação.
Evite uma vida fúnebre.
Fuja também da ideia de imortalidade.
Freud disse que temos resistência a pensar na nossa morte.
Pense um pouco, não pense demais.
Plano de saúde, reserva e um plano funerário: são ideias úteis.
Faça por escrito um testamento e fale das suas vontades.
Não fale sempre e nem muito.
Fale de forma clara uma ou duas vezes nos encontros familiares.
Quer ser cremado?
Prefere um túmulo que nunca será visitado?
Contemplará apenas herdeiros necessários?
É um doador de órgãos?
Cuidado com contas a que só você tem acesso.
Não precisa ser um faraó e nem um deus perene.
Seja humano.
Um bom livro tem um capítulo final.
O último texto não salva a obra, mas pode complicá-la se for confuso.
Depois de tudo decidido e preparado, viva intensamente a experiência única da vida.
Morra só uma vez, em um dia e para sempre.
Antes disso, cultive a esperança, ela deve ser a última a sair da Caixa de Pandora.
Que a morte o encontre vivo.
Fonte: estadao
17/08/2025 16:24